segunda-feira, novembro 26, 2012

Uma história e a Energia Elétrica


Lei é lei, mas existe a história
Sou filho e neto de eletricistas que exerceram com sucesso a profissão que escolheram, um radicado em Florianópolis (João Cascaes – falecido aos 64 anos em 1954) e meu pai (infelizmente morreu com 51 anos) em Blumenau. Assim nasci e cresci conversando sobre energia elétrica, eletricistas, formalismos (nenhum dos dois era diplomado por alguma escola de Engenharia, mas extremamente inteligentes e competentes) e passando minha infância e juventude numa cidade industrial que usava lâmpadas de 220 Volts e 127 Volts, pois no Bairros industriais, que trabalhavam em três turnos, tinham que trocar as lâmpadas quando a sobrecarga exigia. O sistema elétrico era um arquipélago de centenas ou milhares de concessionárias. No Vale do Itajaí tivemos períodos longos de racionamento feroz. As fábricas colocavam baterias de geradores diesel para poderem funcionar e a gente ficava à luz de velas.
Na convivência familiar tive a oportunidade de conversar muito com meu pai. Ele amava falar de política internacional e tinha livros interessantíssimos, que aos poucos fui lendo. Mapas da Segunda Guerra Mundial faziam parte deste acervo e as histórias pessoais dele e de minha mãe (que fora professora em Imbituva e a família viveu os dramas da guerra, perdendo alunos e amigos na Marinha Mercante e na Itália).
O clima ideológico da Guerra Fria estimulou a análise ideológica e assim parti para São Paulo onde fiz cursinho para Engenharia, algo que não era exatamente minha opção profissional à época, adorava a aviação. Em 1964 entrei para o Instituto de Eletricidade de Itajubá (IEI) e na política estudantil a partir de primeiro de Abril de 1964. No ardor da juventude queria participar de novos ideais e da criação de um Brasil organizado, sério e objetivo. Minhas convicções estavam, contudo, abaladas pela invasão da Hungria e da Tchecoslováquia, a democracia parecia impossível lá e cá e pela corrida armamentista, loucura nuclear.
Com toda a formação familiar e colegial assim como a juventude em Blumenau acabei gostando de Engenharia no terceiro ano do curso, quando finalmente entendi o que era essa profissão graças a excelentes e inesquecíveis professores, além de estar numa escola que sabia fazer e usar bem seus laboratórios.
Em 1968, antes de se formar, tivemos a visita da Copel convidando-nos para trabalhar aqui e de outros grupos empresariais. Apaixonado por usinas queria ir para Boa Esperança, algo que meu amigo Lúcio Petit me aconselhou a não fazer, dizia que aquilo parecia um campo de concentração. Aliando isso à vontade de minha esposa e à importância de estar próximo de meus familiares optei pela Copel, fascinado pelo projeto Rio Negro, que se levado adiante daria ao Paraná uma hidroelétrica de 4 mil MW e a oportunidade de diminuir suas enchentes a partir dos pontos de captação de água e barragens que seriam feitas, usina perfeita para o que hoje diríamos ser uso múltiplo das águas.
Infelizmente faltava tudo, inclusive carga para essa usina. O sistema de transmissão não existia e levar tanta energia para os grandes centros de carga parecia desperdício de dinheiro.
Fizeram a Usina Capivari Cachoeira (Usina Parigot de Souza) com uma subsidiária Eletrocap  (Do Capivari ao Cachoeira, 2012) e que poderia ter sido a solução para a redução de cheias no Vale do Ribeira, sempre objeto de todo tipo de estudos, menos do que deveria ser apontado. O ideal é atender modismos importados (Filho & Kalinowski) e esquecer os benefícios de projetos bem feitos dentro dos critérios da época, ou melhor, o uso múltiplo das águas que a regulamentação do Setor Elétrico esqueceu nessas últimas décadas, apesar da falação interminável de ONGs e acadêmicos.
Comecei a trabalhar na Copel em 11 de dezembro de 1968. Admissão simplificada e serviço imediato, parti poucos dias depois para a cidade de Apucarana, onde recebi missões para testar a determinação e formação do novato, além de lhe mostrar a realidade copeliana. A empresa era pequena e tinha sob sua responsabilidade inúmeras cidades paranaenses. Curitiba era de uma concessionária sob controle da União (Companhia Força e Luz do Paraná).
Felizmente o Paraná teve uma sequência de grandes governadores, assim a Copel, prestigiada, crescia e gerava festas em cidades que recebiam a energia elétrica com comícios e foguetórios.
Trabalhei três anos em subestações e usinas diesel e pequenas usinas hidroelétricas, extremamente importantes, pois eram 7 sistemas isolados ou ligados à São Paulo por linhas de 88 mil kV.
Nesse período aprendi na prática a vida do eletricista que trabalha em usinas e subestações, muitas delas rodeadas de vilas completas, pois não podíamos colocar ainda em prática a automação e telecomando era impossível. A moderna TI era um sonho de visionários.
Em 1972 fiz mestrado em Florianópolis tendo como parceiro meu amigo Francisco Roberto Piccione, que me fez uma tremenda falta morrendo muito cedo. Foi um curso de qualidade excepcional, criado pela Eletrobrás (na época tinha acento agudo). Entre outras coisas usei muito um “grande computador”, com 8 ou 16 kBytes de memória RAM, perfuradoras de cartão e o maravilhoso Fortran.
Voltei para a área de estudos do sistema de potência da Copel, subordinado ao Piccione. Nesse período fantástico até 1980 vi e estudei minuciosamente o Sistema Interligado Sul e sua conexão com São Paulo. A ignorância era tão grane em relação ao comportamento dinâmico que nos reuníamos (Sul e Sudeste) para ler e estudar o que significava estabilidade (Sistemas de Potência) e como agir diante da fragilidade do sistema sul. Felizmente um sistema de conservação de carga implantado a partir de decisões do CCOI Sul livrou Paraná, Santa Catarina e Rio grande do Sul de centenas de grandes apagões dando tempo para a formação do sistema atual.
Era época de intensa evolução de máquinas e técnicas de análise, os computadores e mesa surgiam para desespero dos grandes centros de processamento de dados, sempre ciosos de seus poderes.
Minha paixão por usinas levou-me de volta à Divisão de Ensaios e a conviver com usinas e subestações. Via grandes usinas sendo inauguradas e em construção e assim sinto-me à vontade para questionar o açodamento federal em regulamentar a Medida Provisória 579 (As Incoerências da MP 579). Mais uma vez sentimos a pressão de grandes grupos empresariais oportunistas e o medo dessa gente de falar do principal, a carga fiscal sobre a eletricidade.
Sim, a energia é cara para o consumidor comum, pois sobrou para os estados e municípios apenas a metade da Receita fiscal arrecadada e muito mal usada do Brasil. A União quer resolver seus problemas matando os estados e municípios e deixando todos de pires na mão, de quatro diante dos ministros federais.
O tema é longo e não dá para esgotar assim, vamos escrever mais.
Podemos, contudo, dizer que existe muito a ser dito de forma inequívoca e veemente quando a União cria incentivos para montadoras de automóveis, mineradoras, intermediários da FIFA e lança projetos futuristas, desprezando alguns que deveria começar imediatamente, como, por exemplo, a terceira pista do Aeroporto Affonso Pena (Terceira pista do Afonso Pena ainda é um sonho, 2010).
O importante é manter o sul do Brasil subordinado ao sudeste... até quando?
Temos leis mal feitas que só pioram com o tempo,que absurdo.

Cascaes
26.11.2012
Do Capivari ao Cachoeira. (1 de 7 de 2012). Fonte: A Era da Eletricidade: http://blogmro.blogspot.com.br/2012/07/do-capivari-ao-cachoeira.html 
As Incoerências da MP 579. (s.d.). Fonte: ILUMINA: http://www.ilumina.org.br/zpublisher/materias/Noticias_Comentadas.asp?id=19947
Cristo, L. (7 de 1 de 2010). Terceira pista do Afonso Pena ainda é um sonho. Fonte: Paraná On Line: http://www.parana-online.com.br/editoria/economia/news/420056/?noticia=TERCEIRA+PISTA+DO+AFONSO+PENA+AINDA+E+UM+SONHO
Filho, A. O., & Kalinowski, L. M. (s.d.). Transposição e hidrelétricas: o desconhecido Vale do Ribeira (PR-SP). Fonte: Scielo Brasil: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0103-40142012000100019&script=sci_arttext
Sistemas de Potência. (s.d.). Fonte: SENAI SC Tubarão: http://pt.scribd.com/doc/49578615/8/ESTABILIDADE-EM-SISTEMAS-DE-POTENCIA



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